Marta Vidal

SETENTA E QUATRO (28/1/2022)

“Hoje acordámos com o ódio escrito nas nossas janelas.” Foi assim que os donos de uma mercearia árabe em Lisboa denunciaram terem sido alvos de um ataque xenófobo. Numa madrugada de outubro, a mercearia do Médio Oriente Zaytouna (azeitona em árabe) foi vandalizada com uma mensagem ofensiva contra o islão, e duas cruzes patriarcais na montra. 

“Apesar deste discurso de horror ser minoritário, deve ser combatido e denunciado”, escreveram os gerentes da loja luso-palestiniana numa publicação partilhada nas redes sociais. “Não passará, e não teremos medo”, acrescentaram.

Não foi a primeira vez que Lisboa acordou com o ódio à janela, ou espalhado pelos muros da cidade. No ano anterior, mensagens racistas e xenófobas mancharam as paredes de escolas secundárias, faculdades, e o centro de acolhimento de refugiados. “Portugal é branco!”, “Europa aos europeus”, “Deportação das minorias já!” lia-se nas paredes, junto a mensagens de ódio contra comunidades ciganas, negras, árabes e refugiadas.

As palavras de ordem da extrema-direita escritas nas paredes surgiram numa altura de intensificação de ataques racistas e xenófobos, e de maior visibilidade de movimentos de supremacia branca em Portugal.

Em janeiro de 2020, Cláudia Simões, uma mulher negra, foi espancada por um agente da PSP porque a filha se esqueceu do passe de transporte. Meses mais tarde, em julho, um ex-combatente da guerra colonial assassinou o ator Bruno Candé depois de lhe ter dirigido insultos racistas num crime motivado por ódio racial.

Em agosto, ameaças de morte foram enviadas a deputadas e a ativistas antirracistas e antifascistas, pouco depois de um grupo neonazi ter organizado uma marcha com tochas e a cara tapada, ao estilo dos movimentos de supremacia branca, em frente à sede da associação SOS Racismo, que também foi vandalizada com a frase “guerra aos inimigos da minha terra”.

“Desde 2019, quando o partido português de extrema-direita conquistou pela primeira vez lugares no Parlamento, os ativistas de extrema-direita têm sido encorajados a cometer crimes de motivação racial”, alertou a Rede Europeia Contra o Racismo num comunicado publicado em setembro de 2020, em solidariedade com ativistas antirracistas e em condenação do aumento “muito preocupante” de ataques racistas e a banalização do discurso de ódio em Portugal.

Com a fundação do partido Chega em abril de 2019, André Ventura veio normalizar discursos racistas que, embora há muito presentes de forma mais ou menos latente na sociedade portuguesa, passam a encontrar maior espaço de legitimação e empoderamento. Explorando medos e ansiedades, Ventura ataca minorias que são tornadas em bodes expiatórios, dividindo a sociedade entre “portugueses de bem” e os “outros” (…)

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